domingo, 21 de março de 2021

Tecido: Fontes do Desenho Têxtil

    Na sua aplicação á concepção e/ou criação de tecidos devemos pois atender a uma complexa rede de estímulos e informações de que o designer pode lançar mão mas que ele próprio deve ser capaz de seleccionar e eleger perante as necessidades objectivas dum trabalho a realizar.

  
Tecido: Fontes do Desenho Têxtil
Fig.  Tecidos “modern style”

Tecido: Fontes do Desenho Têxtil

Fíg.-A  Tecidos ‘modern style” para decoração

    Essa informação dita estética, a que chamarei “fontes do desenho têxtil”, pode ser sistematizada assim:
    —fontes individuais
    —fontes naturais
    —fontes culturais
    —fontes abstractas
    As fontes individuais residem na pesquisa de pendor interiorista e psico­lógico das preferências colorísticas e formais dos indivíduos, procurando evidenciá-las através de métodos projectivos em que o “acaso” representa um factor operacional decisivo.
    A produção casual de manchas, o uso instintivo de cores, o automatismo no desenho, poderão ser vias a explorar. Uma posterior crítica dessas man­chas, combinações de cores e desenhos é indispensável, procurando encon­trar motivos formalizáveis, que se adaptarão à construção de padrões têxteis, com uma finalidade conhecida.
    As fontes naturais consistem no aproveitamento de elementos da natu­reza ou de elementos urbanos e humanos, que serão sujeitos a um trata­mento de formalização e combinação apropriados. Mas não só as folhas, as flores, as casas, as pessoas, serão motivos ou pontos de partida.
  Uma pesquisa mais profunda e original de novas formas pode ser feita através de técnicas de descoberta, a partir, por exemplo, de cortes feitos em frutos, ou até da observação microscópica de elementos vegetais e animais.
   As fontes culturais podem encontrar-se no estudo das obras de arte, quanto às cores dominantes e mesmo quanto ao desenho. Um quadro poderá assim servir de base para o desenvolvimento de vários tecidos ou padrões.
    Também a pesquisa etnográfica das características de uma região podem servir de base, estudando-se então as cores e formas dominantes na arte popular, nomeadamente de tecelagem ou tapeçaria popular que por ventura existirem.
    O estudo de tecidos primitivos das diferentes civilizações é também outra fonte muito importante, assim como dos períodos das modas antigas ou até mais recentes.
    As fontes abstractas estão ligadas a qualquer dos três tipos anterior­mente referidos, tendo-se em conta que a geometria plana fornece uma gama enorme de possibilidades estruturais que se adaptam facilmente a desenhos geométricos simples, perfeitamente reprodutíveiS por meios mecânicos limi­tados, como por exemplo a tecelagem.
    Por tudo o que ficou dito quanto à função estética se torna óbvio que ela é factor decisivo naquilo a que se chama moda.


Tecido: Fontes do Desenho Têxtil 
Fig. Evolução da estilização do motivo floral típico de caxemira: a palmeta


Tecido: Fontes do Desenho Têxtil
Fig. Interpretação actual do motivo de caxemira. Tecido estampado.

Tecido: Fontes do Desenho Têxtil

Fig. As fontes culturais: em cima –quadro de Mondrian (geométrico abstracto) e sua apropriação pela moda. Em baixo –quadro de Pallok e casaco de senhora com um motivo nele inspirado.

Tecido: Fontes do Desenho Têxtil

Fig Tecido OP dos anos 60


Um Caso de Pesquisa de Fontes Culturais: O Azulejo Português

    Pode estabelecer-se uma relação interdisciplinar entre o desenho do azu­lejo e o desenho têxtil se tomarmos em consideração tanto as suas seme­lhanças que residem principalmente de em ambos os casos se tratar de dese­nho modular, como as suas diferenças que consistem em diferentes maneiras de repetição do módulo e obviamente no diferente uso a que se destinam.
    Com o objectivo de estudar esta possível relação desenvolveu-se uma pesquisa criativa que a seguir se relata. O trabalho foi realizado por um grupo constituído por 6 ex-alunas de desenho têxtil da Escola António Arroio (Ade­laide Borges, Beatriz Martins, Catarina Gonçalves, Clara Afonso, Júlia Vareda e Teresa Cortez) sob a orientação de E. M. de MeIo e Castro e beneficiou de um subsídio de trabalho do Serviço de Belas Artes da Fundação Calouste Gulbenkian. Os trabalhos realizados foram expostos no Centro de Arte Moderna em Julho de 1986.

    1)   OBJECTIVO:
    Apresentar propostas inovadoras de Desenho Têxtil com características estéticas marcadamente portuguesas mas susceptíveis de corresponder ao gosto internacional. Trata-se de conceber objectos têxteis de uso corrente para vestuário, para a casa ou com finalidade puramente estética, nos parâ­metros da concorrência internacional, dentro da qual trabalha a indústria têx­til portuguesa. Deve pois ter-se em vista a funcionalidade e a economia dos recursos, quer técnicos quer estéticos, dentro de um equilíbrio capaz de inte­ressar à classe média europeia. No entanto não deve ser esquecido que o Desenho Têxtil é um valor acrescentado que, embora se dirija a uma clientela internacional, se tem verificado que, quanto mais caracteristicamente original e inovador, mais é capaz de corresponder às exigências da concorrência.
    Deve no entanto levantar-se o problema do que sob o ponto de vista estético deverá ser considerado como “português”, sendo de evitar o «regio­nalismo», o «folclorismo» e o «nacionalismo» dos motivos que, em termos de desenho, são em si próprios noções restritivas.
    Nestes termos procurar-se-ão fontes criativas que correspondam a períodos culturais de intensa criatividade, bem marcados na história cultural portuguesa e cujas formas foram desenvolvidas e praticadas por artistas portugueses.
    Desde logo se impôs o estudo do azulejo como arte caracteristicamente portuguesa ao longo de mais de quatro séculos e na qual confluíram impor­tantes factores internacionais vindos do mundo Islâmico, do sul de Espanha, da Itália e da Flandres. No entanto a azulejaria portuguesa ganhou foros de uma autenticidade e originalidade que a tornam reconhecível como portu­guesa em qualquer parte do mundo.
    Ao escolher o azulejo português como fonte de trabalho para um pro­jecto de renovação do Desenho Têxtil, transpondo a linguagem plástica específica da azulajaria para a linguagem plástica específica dos objectos têx­teis, iniciamos o que se pode chamar um movimento circular de universalização da sua estética através de um outro meio. De notar ainda a forte influên­cia que o Desenho Têxtil exerceu no desenho de azulejo, o que portanto reforça as conexões entre estes dois meios de expressão plástica ligados à utilização pragmática.

    2) PESQUISA:
    O trabalho inicia-se por uma pesquisa de fontes bibliográficas e por visi­tas seleccionadas para reconhecimento «in loco» e recolha fotográfica das principais peças da azulejaria portuguesa dos séculos XVI, XVII, XVIII, XIX e XX.
    Seguir-se-á o estudo analítico das formas, tendo em atenção as caracte­rísticas da repetição dos módulos e do seu arranjo combinário.

    3) REALIZAÇÃO DO TRABALHO:
    Uma vez recolhida esta informação geral trata-se de desenvolver propos­tas de Desenho Têxtil com objectivos práticos bem definidos e tendo em atenção principalmente a tecnologia de reprodução por estamparia.

    4) Apresentação dos resultados do trabalho numa exposição.

     BREVES NOTAS COMPARATIVAS

ENTRE O DESENHO TÊXTIL E O DESENHO DE AZULEJO
    Tanto o desenho de azulejo como o desenho têxtil têm uma base modu­lar e repetitiva. No entanto as regras de repetição do módulo num e noutro tipo de suportes variam por razões técnicas.
    O azulejo é, como se sabe, um suporte de cerâmica geralmente quadrado que se usa para revestimento de superfícies interiores e exteriores de edifí­cios. Ë aplicado um a um e isso permite a colocação do módulo do desenho em várias posições formando efeito decorativos diferentes, a que se pode chamar PADRÕES.
    Existem de facto padrões que resultam ,da colocação do módulo sempre na mesma posição (A) ou da sua rotação em torno de um dos vértices (B). Neste caso podem originar-se padrões com dois ou mais centros ópticos. Outros padrões são constituídos por dois módulos que podem eles próprios combinar-se em várias posições (C) formando geralmente efeitos marcados horizontal ou verticalmente. Há ainda padrões de 4 módulos e ainda maiores (D) que resultam em grande complexidade decorativa.
No desenho têxtil para estamparia o caso é todavia diferente. Ë que o desenho modular vai ser transposto para uma superfície: a peça de tecido que tem a largura fixa (entre 1 m e a 2 m) e um comprimento de algumas dezenas de metros. O processo de transferência do desenho permite apenas repetição do módulo quadrado ou rectangular na mesma posição, no sentido da largura e do comprimento do suporte. Trata-se portanto de uma repetição simples em sentidos perpendiculares devendo por isso o módulo corresponder inteiramente ao padrão decorativo final (E).

Tecido: Fontes do Desenho Têxtil

    O desenhador têxtil deve produzir o módulo do efeito que se formará pela repetição ortogonal desse módulo. No entanto os limites desse módulo desaparecerão e o efeito será contínuo e sem fragmentações.
  Uma relação entre o desenho de azulejo e o desenho têxtil deve tomar em consideração esta condicionante do desenho têxtil e estudar os padrões de azulejo apenas como fontes de motivos (totais ou parciais) que deverão ser desenvolvidos numa linguagem visual adequada ao tecido. Deve-se tam­bém ter presente que o tecido se destina a ser usado em áreas parcelas com­pondo um outro conjunto: o modelo ou figurino que se destina a cobrir cor­pos humanos em movimento, como é o caso dos tecidos para vestuário.
    A linguagem do desenho têxtil deve ser por isso muito mais dinâmica e fluida que a linguagem do desenho do azulejo. Tal dinamismo pode obter-se no entanto a partir de motivos típicos do azulejo que agora deverão ser trata­dos pelo desenhador com vista às características da sua nova utilização: os tecidos e os seus variados usos.
    Há portanto razões técnicas e razões funcionais a condicionar o trabalho têxtil a que se vêm juntar as razões económicas limitando o número de cores, pois a cada cor corresponde geralmente um quadro de estampagem que e necessário abrir (estamparia lionesa). No entanto as possibilidades cromáti­cas são muito mais amplas do que as cores geralmente usadas nos azulejos. Devem ainda referir-se as imposições de carácter estético, estas directa e totalmente condicionadas por uma necessidade de renovação periódica, a curto prazo, a que se chama MODA. O desenho têxtil é efémero e dura ape­nas alguns meses, dentro do ciclo Primavera-Verão e Outono-Inverno, exigindo do desenhador uma constante atenção e esforço de renovação. Igualmente o suporte tecido é delicado e de pouca duração, contrariamente à cerâmica e aos suportes dos azulejos que são estáticos e duram dezenas de anos ou mesmo até alguns séculos.

    O trabalho do desenhador têxtil é pois interminável, entre as formas e as cores envelhecidos pelo consumo e as novas propostas da moda da próxima estação. A pesquisa de fontes para o desenho têxtil faz parte dessa dialéctica entre o passado e o futuro.

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